Se hoje é impensável sair de casa sem o celular, era assim com o chapéu e a bengala há 60 anos. Tradicionalmente, todas as manhãs, pela lateral da Rua da Assembleia, os parlamentares da então Câmara dos Deputados, sede do Poder Legislativo Federal, entravam com seus carros pelo portão C do Palácio Tiradentes. O destino era a chapelaria, primeiro ponto de parada localizado no térreo, onde além de guardarem seus pertences, como mala, chapéu e bengala, recebiam eventuais correspondências e mensagens de eleitores.

Quem entrava no ambiente, por uma das três equidistantes portas de madeira, se deparava com paredes ladrilhadas entrecortadas na parte superior por oito claraboias de ferro e adornadas por sancas de gesso que contornavam o teto. Diante do balcão de jacarandá com tampo de mármore verde, os parlamentares entregavam seus pertences ao recepcionista, que os acomodava em uma das prateleiras. Perpendicularmente ao balcão, cada uma das oito estantes, também de jacarandá, era composta por quatro prateleiras e um cabideiro de cada lado. No total, a chapelaria tinha capacidade para guardar 500 peças.

O material destinado aos deputados era repassado ao chofer, que seguia com o automóvel pela galeria transversal em direção à Rua São José e estacionava o carro na ampla garagem localizada nos fundos do palácio. Já os parlamentares seguiam por um dos dois elevadores localizados nas laterais da sala. Um deles, exclusivo para o deputado que ocupava cargo presidencial, dava acesso direto ao gabinete.

A chapelaria, no entanto, acompanhou o declínio deste acessório. No século XX, até os anos 1950, quase ninguém saia de casa sem um chapéu, símbolo de elegância e sofisticação. A partir dos anos 60, entretanto, com o crescimento dos movimentos estudantis, os jovens passaram a ignorá-lo para se diferenciar dos pais. No final da década de 70, o uso do acessório já estava praticamente extinto. De lá para cá muita coisa mudou e os chapéus ficaram “démodé”.

Hoje, a antiga sala se tornou Divisão de Portaria, uma espécie de entreposto entre os Correios e os parlamentares. Embora os deputados tenham tirado o chapéu há anos, cartas continuam chegando, lembrou Leandro Pinho, encarregado pela Divisão e servidor público da Alerj desde 1994. “Mesmo num mundo cada vez mais digitalizado, recebemos diariamente envelopes escritos a mão de eleitores dizendo ‘ao meu amigo deputado’. Esse carinho é muito cativante. A vida da Casa passa por aqui”, conta.

A sala guarda ainda algumas características originais como o balcão de jacarandá e os elevadores privativos. Para Lenise Severino, arquiteta da Alerj, a restauração da antiga chapelaria seria interessante caso o Palácio Tiradentes se tornasse um museu. “É uma pena que a sala tenha sido totalmente modificada pela necessidade da época. Ela era linda! Aliás, todo o Palácio. No futuro, nosso objetivo é reconstruí-lo como fora inicialmente projetado”, afirma.