O Dia Nacional da Visibilidade Trans é comemorado em 29 de janeiro. A data histórica surgiu em 2004, quando um grupo de ativistas da causa lançou a primeira campanha contra a transfobia no Congresso Nacional. Mesmo 17 anos depois, funcionários da Alerj afirmam que encontraram no Parlamento fluminense respeito às diferenças, mas ainda há muito a avançar na sociedade. 

Segundo dados da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), estima-se que 90% da população de travestis e transexuais se prostituem pela dificuldade de inserção no mercado formal de trabalho e por deficiência na qualificação profissional causada pela exclusão social, familiar e escolar. Maiara Fafini, de 55 anos, é psicóloga e exceção nessa estatística. Desde 2019, Fafini trabalha na Comissão de Direitos Humanos da Alerj e conta que, mesmo não tendo todos os seus registros atualizados, o crachá foi entregue com o nome social informado já no primeiro dia de trabalho.

"Para algumas de nós, ter um emprego já é um privilégio. Quando o seu nome social é respeitado no crachá, percebemos que estamos avançando pouco a pouco. Nos sentimos seguras ao sermos tratadas pelo nosso nome. Se eu chegasse aqui e na entrada as pessoas me tratassem pelo meu outro nome, eu nem entraria nesse espaço. Me senti acolhida na Alerj", relatou Maiara. A psicóloga ainda lembrou que levou três anos para mudar o nome no RG. "Hoje eu calculo que esse prazo seja entre três e seis meses, se a pessoa não tiver muitos documentos para fazer a troca. Tudo isso, por causa da alteração feita em 2018, no Congresso Nacional,  da Lei 6.015/73, que define as regras dos registros gerais e que permitiu a troca de nomes direto nos cartórios. Mas ainda assim é um processo extremamente burocrático", explicou.  

O crachá da Alerj também vai ficar na história do funcionário José Jéssica Silveira, de 26  anos, assessor no gabinete do deputado Noel de Carvalho (PSDB). O publicitário contou que esse é o segundo documento que ele tem com o nome social registrado. "A primeira vez que assinei meu nome social foi em um recibo de um trabalho de freela e guardo esse registro até hoje. E agora, somado a ele, vou guardar o meu crachá da Alerj. Se pensarmos que todo mundo consegue chamar a Xuxa, de Xuxa, e não de Maria das Graças, entendemos o que é o nome social e como ele deveria ser respeitado", disse. 

José já começou o processo de mudança nos documentos, mas lembrou que é um serviço caro. "Gasta-se, em média, R$ 500 para fazer essa atualização. E poucos são os que têm condições de fazer isso. Para ter o meu nome social no crachá da Alerj, eu só precisei enviar um e-mail, isso foi um presente pra mim. Me senti representado", elogiou. Para o deputado Noel Carvalho, ter o José trabalhando com ele é um aprendizado diário. "Sou de outra geração, mas sempre respeitei o diferente e sempre aprendi com a diversidade. Ter o José na nossa equipe só enriqueceu ainda mais o nosso trabalho", afirmou.

Em 2020, segundo dados da Antra, 152 pessoas trans foram assassinadas no Brasil, um número maior do que nos dois últimos anos. Esse é um dado que preocupa José e Maiara. "Nós somos a nossa própria política. Viver sabendo que a média de vida das pessoas trans no Brasil hoje é de 35 anos faz com que a gente precise ocupar espaços políticos para lutar pela nossa existência", afirmou José. "As pessoas sabem que a gente está lá, mas como elas não nos reconhecem, a gente passa invisível. Cada vez que comemoramos uma data como essa, estamos mostrando para a sociedade que temos direitos", desabafou Maiara. 

A presidente da Comissão de Direitos Humanos da Casa, deputada Renata Sousa (PSol), complementa a fala da Maiara, afirmando que ter pessoas trans trabalhando na comissão traz tranquilidade, "Esse é um espaço para gerar diálogos de diversidade, que possam contribuir para o nosso trabalho. Maiara é extremamente qualificada e capacitada. Assim como ela, existem tantas outras.  É com esse trabalho que conseguimos apresentar projetos que tragam mudanças para a vida dessas pessoas", concluiu a parlamentar.