Todas as terças, quartas e quintas-feiras, sob a mesa da presidência no Plenário da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), um grupo de funcionários está de ouvidos e mãos a postos, atentos a cada palavra dita durante as sessões de votação. O Departamento de Taquigrafia é responsável por transcrever os eventos, os discursos e as decisões tomadas pelos deputados e disponibilizá-los no portal da Casa. Com uma equipe de 28 taquígrafos, o setor se reveza no Plenário para oferecer à população um registro escrito de tudo que acontece no Parlamento fluminense.

“Cada um de nós é responsável por cinco minutos de transcrição, que rende em média de 3 a 4 laudas, às vezes até mais”, explica Maria Goretti Lameira, taquígrafa e diretora do departamento. Após a transcrição, cada funcionário retorna ao 5º andar do Palácio Tiradentes, onde fica o setor, para “traduzir” os símbolos que representam fonemas em, de fato, palavras. Normalmente, a transcrição de toda sessão plenária é disponibilizada em, no máximo, duas horas após o término da mesma.

Concursada do departamento desde a redemocratização, a diretora Goretti diz que viu o setor acompanhar as mudanças no Parlamento fluminense. “Antes, tudo era feito em plenário e as comissões quase não tinham tanta importância, diferente de hoje. Tudo o que acontece nelas, sejam as reuniões ou as audiências, têm um impacto enorme para a Casa, sendo muito importante registrá-las. Foi uma das grandes mudanças desde que entrei”, explica a diretora. Atualmente, a Taquigrafia também transcreve as solenidades de deputados e os eventos do Fórum Permanente, entre outras iniciativas. “Como não há uma equipe grande o suficiente, temos uma parceria com o setor de som, que registra os eventos que não acontecem no Plenário”, conta.

Mudanças

E não só as mudanças no cotidiano da Alerj impactam o trabalho do setor, as tecnológicas também. Questionada sobre os programas de computador e os aplicativos de celular que transcrevem áudio em texto, a diretora respondeu sem dúvida. “Eu acho que o taquígrafo é uma profissão que tende a ser extinta, sim. O computador daqui a pouco vai ganhar, mas não por enquanto. Essa profissão ainda é extremamente importante para o trabalho da Casa”, fez questão de destacar. “Quando os deputados falam mais pausadamente, destacando todas as sílabas das palavras, com a pontuação bem marcada, esses programas até conseguem traduzir, mas ainda assim, sem pontuação e errando algumas palavras”, explica.

Do latim, “escrita rápida”

De origem milenar, a taquigrafia é um método de escrita abreviado, com a intenção de aumentar a velocidade do registro de forma a acompanhar a fala das pessoas. A própria origem do nome já denota essa função: do latim, o termo é uma junção de “tachys” (rápido) e “grafia” (escrita). A taquígrafa da Alerj, Deborah Botelho, que é professora da técnica há mais de 20 anos, explicou que ela consiste em representar os fonemas (ou seja, os sons) das palavras e não a forma como elas de fato seriam escritas. “Aprender a taquigrafia é quase como uma alfabetização, você aprende o bê-a-bá quase como uma criança”, diz.

Botelho garante que a caligrafia (escrita à mão) e nem mesmo a datilografia (no teclado) são capazes de acompanhar o ritmo da fala. “É impossível! Eu sempre fui uma exímia datilógrafa, muito rápida. Mas nem a digitação, em que você faz de 120 a 130 toques por minuto, consegue alcançar a velocidade da taquigrafia”, diz. A rapidez, no entanto, vem com muito tempo de treinamento, reforçou a diretora Goretti. “Durante o concurso para a Casa, eu treinei nove horas por dia durante três meses. Se errasse uma palavra, ficava repetindo ela em umas três páginas”, conta.

E não se engane, não existe uma fórmula pronta para representar as palavras na taquigrafia: são várias! Além da variação de acordo com a língua (no inglês, por exemplo, o “th” produz um som que não existe no português), há diferentes estilos taquigráficos, como o Maron, o Martí e o Leite Alves. Dentro de cada estilo, ainda é possível formar taquigramas, símbolos que representam palavras, expressões ou até mesmo frases.

Fazendo uso dessa técnica datada de antes de Cristo, os taquígrafos da Alerj são responsáveis por guardar cada discurso e decisão da memória da política fluminense e nacional. Mesmo com 23 anos de Casa, Botelho disse que todo dia ainda é agitado. “Aqui é uma caixinha de surpresas, é sempre uma incógnita. Tudo pode acontecer”, conclui.