O céu de segunda-feira, 12 de novembro, amanheceu aberto. Pouco antes das 9 da manhã, já não havia indícios de que iria chover ao longo do dia, o que animou o operário Pedro Carvalho. Ele é ascensorista da obra no Edifício Lúcio Costa, futura sede da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), mas é também o organizador do Bola na Praça, um campeonato de futebol realizado no horário de almoço dos trabalhadores que já está em sua segunda edição. Após a final ser adiada por conta de uma semana chuvosa que alagou o Buraco do Lume, o “estádio” desta competição, os jogadores dos quatro melhores times do torneio - Marrento, Baixada, Estrela e Deu Certo - se enfrentaram para definir o pódio.

“Foi uma brincadeira maneira que a gente começou no turno da noite, mas decidiu passar para o dia também. Acabou se transformando em um campeonato e deu no que deu. É a alegria dos operários da obra da Alerj”, explicou Pedro.

Era meio-dia quando o anfiteatro do Buraco do Lume, apelido da Praça Mário Lago, no Centro do Rio, começava a ganhar cara de uma final de futebol: Pedro pendurava “bandeirinhas” feitas com embalagens plásticas sobre o campo, acompanhado de Bruno Silva, soldador e coorganizador da competição. A torcida também começava a ganhar forma com os operários distribuindo entre si plaquinhas de papelão e balançando bandeiras feitas com canos e sacos de cimento. Às 12h20, começava o primeiro jogo.

Os times tinham três jogadores e as partidas foram divididas em dois tempos, cada um durando cerca de dez minutos, podendo variar de acordo com o horário definido para a volta ao expediente. As regras eram simples (xingamentos, por exemplo, eram proibidos) e quem ficou responsável pelo apito foi o ascensorista Pedro. Mas a torcida também fazia o seu papel: além de vibrar a cada gol e gritar “olé” em cada drible, a "arquibancada" ficava de olho no juiz. “Olha a mão nas costas, Pedrão”, reclamou um dos trabalhadores.

No meio do caminho

A aglomeração e o canto da torcida chamavam a atenção de quem passava em frente à praça. Odete de Jesus, dona-de-casa de 63 anos, voltava de uma consulta médica quando resolveu assistir ao jogo. “Eu vi um tumulto de longe, ouvi uma gritaria e resolvi espiar”, contou. E ela não foi a única. Conforme a bola rolava, transeuntes e trabalhadores também em horário de almoço se juntavam ao redor do anfiteatro, disputando um espaço na sombra para se proteger do calor. “Só mesmo futebol para fazer a gente parar embaixo desse sol forte”, brincou o advogado Rodrigo Avelino, de 38 anos, que trabalha na região.

Para a comerciante Maria Oliveira, de 48 anos, a “brincadeira” transformou a praça e trouxe frutos para os negócios. “Mesmo com o movimento da região, aqui ficava muito morto, vazio. Eles praticamente revitalizaram o espaço. Quem costuma ver o jogo são os homens e eles são mais pães-duros, mas toda mulher que para ali na praça acaba parando aqui também”, conta aos risos de dentro da sua barraca de roupas montada na Rua São José.

Resultados

Era quase 13h quando o apito do juiz “Pedrão” anunciava o fim da segunda e última partida. Ganhando de 1 a 0, o Estrela faturou o 3º lugar sobre o Deu Certo. A partida que definiu o campeão teve um resultado mais apertado, 3 a 2, garantindo a vitória do Marrento sobre o Baixada. “A gente começou o campeonato como ‘vilão’ porque era um time de ‘mais gordinhos’ e os melhores se juntaram em uma panelinha, mas um jogo se decide em campo e a gente mostrou como”, lembrou o “marrento” Bruno Silva, que também estava na organização. Na hora da foto com o troféu de primeiro lugar, fez questão de dizer: “Esse aqui é para o meu neto. Te amo!”.

E teve jogador que saiu com três troféus: Thiago Barbosa, também do Marrento, foi eleito pela torcida o melhor jogador e artilheiro da competição. “Fazer parte dessa obra e dessa brincadeira vai ficar marcado na minha vida”, comemorou.

Feita a premiação, chegava a hora de voltar ao expediente. Depois de uma brincadeira que virou coisa séria e ressignificou um pedacinho do Centro do Rio, a sensação é de que todos saíram vencedores. “A gente vai continuar com os jogos aqui na praça, transformando a tristeza em alegria”, garantiu Pedrão, organizador, juiz e operário.